Era um jantar a dois, uma mesa pra
dois, num restaurante duas estrelas. Havia duas velas, duas toalhas de
mesa e dois garçons apenas. O casal chega, senta, pedem duas taças de um
vinho barato enquanto decidem o prato principal. Escolhem o item dois,
uma macarronada. Quem é que vai num restaurante comer macarronada? Eles
iam, toda sexta feira. Um dos garçons se aproxima, anota atenciosamente o
pedido e entrega o pedido da mesa dois no balcão. Conversa vai,
conversa vem, hoje completavam dois anos de namoro. Quem é que comemora
dois anos de namoro num restaurante duas estrelas? Eles comemoravam,
todo ano.
Ela prendia o cabelo
com dois laços, ele tinha duas tatuagens. Eles moravam no apartamento
dois, segundo andar, numa rua do centro da cidade. Um quarto, uma sala,
uma cozinha, dois banheiros e duas prateleiras de livros e cds. Era esse
o tal mundo dos dois. Ah, e tinha o resturante, esse da macarronada,
que ficava a duas quadras do apartamento. Tinha a faculdade que só
precisava passar por dois pontos e pronto, chegavam. Tinha o curso dela,
começado a dois anos, e o curso dele, que terminava em dois meses. E o
ateliê, no fundo do pequeno apartamento, com dois quadros inacabados
pendurados em meio a tantos outros que ela gostava de fazer quando
estava só.
Ela pensava na janela
que deixara aberta e no tempo de chuva que se formava, ele olhava pra
ela e pensava quando ela finalmente pararia de usar aqueles laços
infantis no cabelo. Ela olha pra ele e não vê o cara que sonhou, ela vê o
cara que mesmo as duas da manhã a faz rir com uma piada sem graça, que
mesmo com um cabelo sem cortar a dois meses fica lindo assim que sai do
banho, o cara que ela precisava. Ele repara no olhar dela. Ele pensa nos
olhos dela. Ele pensa nela. Em como ela é bonita sem dois quilos de
maquiagem numa manhã de um domingo, como o sorriso dela deveria valer
dois bilhões e em quantos mil mistérios aqueles dois olhos guardavam.
As
duas amigas da mesa vizinha observam o casal. As duas já comentam o
quanto é bonito ver pessoas assim, amantes. Ele tira um embrulho pequeno
de dentro do casaco, elas suspiram já imaginando que ali seria o grande
pedido. Ela olha o embrulho confusa e abre. Uma pulseira com dois
pingentes, dois corações. No rosto dela escorrem duas lágrimas, no rosto
dele estampa a alegria de uma criança de dois anos assim que recebe um
elogio. Nos rostos dos dois a gente via o amor. Ele prende a pulseira
nela, beija sua mão levemente, ela suspira duas lentas vezes. Ela puxa
as duas mãos dele e as aperta com força e sorri. Ele sorri. Eles riem.
Elas, as amigas, já enxugam as lágrimas em companhia dos dois garçons.
O
casal termina o jantar e sai, os dois abraçadinhos, encolhidinhos,
dentro de um pequeno guarda-chuva. As duas amigas, cada uma com seu
carro, pensam em oferecer uma carona. Mas veem o casal brincando
enquanto atravessam a rua, desviando de algumas poças e carros, como se
fossem crianças e riam, ah, as risadas daqueles dois curava qualquer
doença, alimentava qualquer carência. Os dois corações, tanto no pulso
dela, quanto nos corpos dos dois, deixavam aquela tarde chuvosa tão
bonita. Tão amável. Era dia dois dois, dia de curtir a dois, só os dois.
E assim eu termino a história. Era nós dois.
Nenhum comentário:
Postar um comentário